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Certa vez, de férias na cosmopolita Rio de Janeiro, observei uma cena em praça pública que me emocionou. Era um senhor idoso, que sentado em um banco, distribuía alimento para as pombas e outras espécies de passarinhos, que bem à vontade, esvoaçavam ao seu redor pousando em seu ombro, pernas e braços. Cheguei a contar doze deles pousados em seu corpo, e mais um tanto em sua volta, no banco. Sem dúvida, uma cena inusitada que lembrava Francisco de Assis e a sua fantástica obra em defesa da natureza e dos animais - "Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz".
Em outra oportunidade, observei em uma escola pública, a presença de um gambá adulto, que acuado pelo movimento das pessoas, subiu uma pequena árvore e ali ficou, acessível ao olhar dos curiosos que manifestavam as suas opiniões a respeito do que presenciavam. Entre expressões de repulsa em relação à "feiúra" do usurpial, ouvia-se expressões de exaltação à sua beleza. Paradoxo característico da natureza humana ao analisar outros seres da natureza considerados "exóticos".
Posteriormente, fiquei sabendo que o gambá foi recolhido pela patrulha ambiental da Brigada Militar para ser devolvido -são e salvo- a seu habitat natural. História com final feliz...
Em relação a essa espécie que se reproduz rapidamente e cuja fêmea costuma levar os seus filhotes em uma bolsa tipo canguru, tenho contato quase que diário, pois resido em uma região de morros com núcleos de áreas verdes permanentemente preservadas, e uma delas fica atrás da minha residência onde sobrevivem gambás e outros pequenos animais nativos.
No início da noite, costumo de dois a três dias por semana, alimentá-los com bananas e sobras de frutas utilizadas no consumo diário. Percebo que eles já identificam o meu cheiro e, provavelmente, a minha energia, pois demonstram confiança ao se aproximarem do local onde deposito o alimento..
Um animal nativo, perdido e afastado de seu habitat natural, é como um ser humano urbano nas mesmas condições de insegurança e medo quando sente-se perdido no ambiente natural selvagem. Mas com uma diferença: os animais somente invadem o espaço urbano ou doméstico, porque antes, invadimos o espaço deles com as nossas máquinas, ruas, casas e muros.
Portanto, considero que os animais não devem ser discriminados entre os de inclusão (cão, gato, entre outros), e os de exclusão (gambá, lagarto, cobra, etc.). Uma cobra é apenas uma cobra... e se invadiu o espaço doméstico deve ser capturada e devolvida ao seu ambiente natural. E assim o lagarto, o gambá, entre outras espécies que merecem o nosso respeito.
O respeito às diferenças é o primeiro aprendizado no contexto do amor fraternal, e experenciamos esse sentimento quando praticamos compaixão para com todos os seres da natureza. É a lei de causa e efeito que funciona tanto na dor quanto no amor.
Segundo o espiritismo, os animais tem alma (diferente da humana), inteligência rudimentar, evoluem, sobrevivem à morte do corpo físico e, na Terra, merecem o respeito e a proteção do homem.
Como a espécie hominal, a espécie animal também evolui lentamente no sentido da inteligência e da sensibilidade. Seus espíritos reencarnam e desencarnam acompanhando o ciclo da vida e da morte física. Porém, num patamar inferior ao homem.
Reportando-nos à história grega, conta-se que Licurgo foi convidado a falar sobre educação. O grande legislador de Esparta aceitou, mas pediu um ano para preparar o material que iria apresentar.
Exigência aceita, prazo cumprido, ei-lo diante da multidão que compareceu para ouvir-lhe os conceitos. Trazia duas gaiolas. Numa estavam dois cães; duas lebres na outra.
Sem nada dizer, tirou um animal de cada gaiola, soltando-os. Em instantes o cão estraçalhou a lebre.
Libertou em seguida os restantes. O público estremeceu, antevendo nova cena de sangue. Surpresa: o cão aproximou-se da lebre e brincou com ela. Esta correspondeu, sem nenhum temor às suas iniciativas.
"Aí está senhores -esclareceu Licurgo-, porque pedi prazo tão extenso, preparando esses animais. O melhor discurso é o exemplo. O que mostrei exemplifica o que pode a educação, que opera até mesmo o prodígio de promover a confraternização de dois seres visceral e instintivamente inimigos".
O exemplo de Licurgo mostra-nos, que se é possível educar animais, mesmo antagônicos, levando-os à convivência pacífica, naturalmente será possível educar as crianças, incutindo-lhes desde cedo o respeito devido aos semelhantes e à natureza - fauna e flora.
Flavio Bastos - psicoterapeuta
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